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Os anos intensos do soviético Igor Shalimov na Serie A

Houve uma época em que era muito raro que jogadores do Leste Europeu atuassem nos campeonatos “ocidentais” – especialmente se estes atletas fossem provenientes das repúblicas soviéticas. No ocaso da União Soviética, o meio-campista Igor Shalimov foi um dos primeiros russos a acertarem com uma equipe da Serie A e foi exatamente na Itália que ele jogou por mais tempo.

Shalimov nasceu em Moscou e, como vários soviéticos, via seu pai Mikhail ir trabalhar na fábrica todos os dias, ao passo que sua mãe Ludmila cozinhava para fora. Apesar de gostar de xadrez e ser amante da clássica literatura russa, Shalimov abandonou os estudos aos 16 anos e, só então, dedicou-se de fato ao futebol. Dos sete aos 11 anos ele participava da escolinha do Lokomotiv, mas foi no Spartak que concluiu sua formação e estreou profissionalmente.

No chamado “time do povo”, Shalimov logo foi visto como um jogador versátil. Apesar de meio-campista de origem, o jogador foi utilizado muitas vezes como lateral ou ala pela esquerda no Spartak, ao passo em que atuava como meia central pela direita na seleção. Em cinco anos pelo time vermelho e branco, Igor conquistou duas taças federativas e uma copa soviética, se destacando como um dos principais talentos do país.

Igor Shalimov foi fundamental para a conquista da Euro Sub-21, em 1990, mesmo ano em que recebeu as primeiras convocações para a seleção principal da USSR, com a qual disputou a Copa do Mundo, na Itália. Estes foram os primeiros passos para que ele começasse a ter reconhecimento internacional.

O meia russo se destacou no Foggia de Zeman e logo deu um salto: fechou com a Inter (imago)

Em 1991 algo de muito relevante para o futebol estava acontecendo na Itália – e longe dos grandes centros. O pequeno Foggia voltava para a elite após 12 anos de ausência e levava para a Serie A um futebol extremamente ofensivo, destoante da tradição defensiva que marcava a história do esporte no Belpaese. O técnico do time era o checo Zdenek Zeman, que pediu à diretoria para acertar com dois jovens talentos russos: justamente o meia Igor Shalimov (22 anos), do Spartak, e o atacante Igor Kolyvanov (23), do Dynamo.

A primeira temporada da Zemanlândia na elite foi muito boa: os satanelli ficaram com a 9ª posição na Serie A e por pouco não se classificaram para a Copa Uefa – foram cinco pontos de distância para a Roma, última qualificada para o torneio europeu. Shalimov se encaixou rapidamente no time de Zeman por causa de sua versatilidade, fôlego, dedicação tática e pela boa qualidade em passes e finalizações. Originalmente, o treinador o utilizou como trequartista, mas o russo também atuou mais recuado, como regista, armando o jogo para o trio formado por Giuseppe Signori, Roberto Rambaudi e Francesco Baiano.

No entanto, Shalimov aproveitou o estilo ofensivo do Foggia (que teve o segundo melhor ataque do campeonato, com 58 gols marcados) para participar ativamente da artilharia da equipe: com nove tentos anotados, ficou atrás apenas de Baiano (16) e Signori (11). O gol mais recordado do soviético pela equipe rossonera foi contra o Bari, no Dérbi da Apúlia, vencido por 3 a 1 e no qual Shalimov foi o melhor em campo. Ao fim da temporada, o meia foi considerado como um dos melhores estrangeiros da Serie A.

O destaque no “Foggia dos milagres” e algumas desavenças com Zeman pelos treinamentos excessivos e muito cansativos levaram a uma mudança de ares para Shalimov. Depois de disputar a Euro 1992 pela seleção da Comunidade dos Estados Independentes (o time da CEI foi criado após a dissolução da URSS, classificada à competição), o meia acertou transferência para a Inter, que buscava se reformular após um ano negativo. Em 1992, os alemães por Lothar Matthäus, Andreas Brehme e Jürgen Klinsmann deixaram Milão e os nerazzurri acertaram com Shalimov, o lateral esquerdo Luigi De Agostini, o meio-campista Matthias Sammer e os atacantes Salvatore Schillaci, Rubén Sosa e Darko Pancev.

Pela Inter, Shalimov conquistou seu único título na Itália (Allstar/imago)

Assim como aconteceu na Apúlia, o soviético se ambientou rapidamente e conseguiu uma vaga no time titular. O técnico Osvaldo Bagnoli escalou Shalimov como ala pela direita e lhe deu bastante liberdade para atacar. Dessa forma, o russo voltou a marcar nove gols na Serie A – anotou nas duas vitórias sobre a Juve e fez uma doppietta sobre o Foggia – e ajudou os interistas a alcançarem o vice-campeonato e uma vaga na Copa Uefa.

A participação na competição continental foi o último grande momento de Shalimov com a camisa nerazzurra. O russo já havia ganhado a concorrência dos holandeses Wim Jonk e Dennis Bergkamp e, como entrou em má fase, perdeu a titularidade. Mesmo assim, atou bem na Copa Uefa e fez gols importantes para a classificação da Inter nos 16 avos de final, contra o Apollon Limassol, e nas quartas, diante do forte Borussia Dortmund. A Beneamata foi campeã do torneio e Igor ergueu sua única taça em solo italiano.

Como não jogou bem em 1993-94 e estava pressionado pela torcida, Shalimov mais uma vez decidiu mudar de time. O meia foi emprestado ao Duisburg, mas não causou impacto e foi incapaz de ajudar as zebras a se manterem na Bundesliga. No último ano de contrato com a Inter, ele voltou a ser emprestado, desta vez ao Lugano, da Suíça. Em seis meses pelo clube helvético, conseguiu sentir o doce gosto da vingança ao eliminar os nerazzurri na Copa Uefa.

Depois de passar a primeira parte da temporada nos Alpes, Shalimov voltou à Itália para acertar com a Udinese, clube que o desejava havia algum tempo. Jogando no meio-campo, o novo reforço não conseguiu marcar gols nos seis meses em que ficou em Údine, mas acabou convocado para defender a Rússia na Euro 1996. Foi a primeira vez que ele defendeu a recém-formada seleção em um grande torneio, já que ele havia se recusado a ir à Copa de 1994 por desentendimentos com o técnico Pavel Sadyrin.

Shalimov defendeu cinco equipes na Itália, incluindo o Bologna (Allstar/imago)

A verdade é que, aos 27 anos, o russo não conseguia mais alcançar o mesmo nível de atuações que outrora por falta de condicionamento físico. Sem conseguir manter a forma, suas principais qualidades foram minguando: não exercia sua versatilidade, raramente completava 90 minutos em campo e também não chegava na área adversária para finalizar. Reserva no Bologna, sua última temporada digna foi a de 1996-97, na qual atuou apenas 18 vezes, mas com quatro gols marcados.

Em 1998, após dois anos de pouca utilização na Emília-Romanha, Shalimov aceitou jogar a Serie B com a camisa do Napoli, mas nem mesmo na segundona ele se destacou: apresentando muita lentidão ao fazer as jogadas e ficando alheio ao jogo, o russo foi muito contestado pela torcida. No final da temporada, o meia foi pego no exame antidoping por uso de nandrolona e foi suspenso por dois anos. Com isso, decidiu se aposentar.

Após pendurar as chuteiras precocemente, aos 30 anos, Shalimov decidiu se tornar treinador, mas nunca obteve muito destaque. Seu principal trabalho foi à frente da seleção feminina da Rússia, entre 2008 e 2011.

Igor Mikhailovich Shalimov
Nascimento: 2 de fevereiro de 1969, em Moscou, União Soviética (atual Rússia)
Posição: meio-campista
Clubes como jogador: Spartak Moscou (1986-91), Foggia (1991-92), Inter (1992-94), Duisburg (1994-95), Lugano (1995), Udinese (1995-96), Bologna (1996-98) e Napoli (1998-99)
Títulos como jogador: Campeonato Soviético (1987 e 1989), Copa da União Soviética (1987), Euro Sub-21 (1990) e Copa Uefa (1994)
Carreira como treinador: Krasnoznamensk (2001-02), Uralan Elista (2003), Seleção feminina da Rússia (2008-11) e Krasnodar-2 (2015-16)
Seleção russa (incluindo jogos por União Soviética e CEI): 47 jogos e 5 gols

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