Técnicos

Roy Hodgson: patacoadas também na Serie A

Ele está fora. Roy Hodgson, técnico da Inglaterra, não resistiu a mais um vexame do English Team e, após a eliminação nas oitavas de final da Euro 2016 contra a pequena Islândia, pediu demissão do cargo. Não deixa de ser irônico que o treinador tenha caído após perder para a seleção de um país nórdico, da mesma região do globo em que mais teve sucesso.

À frente da seleção inglesa, Hodgson teve exposição comparável apenas às que teve quando foi técnico de Inter e Liverpool. No entanto, os holofotes apontados para ele só evidenciaram o pior: o comandante londrino fez o mesmo que seus antecessores. Ganhou milhões sem merecimento, deixou a torcida empolgada e fracassou na Copa do Mundo e na Euro mesmo com uma boa geração a seu dispor. Acabou sendo mais lembrado por suas feições e gestuais pitorescos, além da total falta de intimidade com uma mentalidade vencedora e o poder de incentivar e convencer seus comandados de suas ideias.

A definição do Felipe Portes, dono da Todo Futebol, é precisa. A cena antológica do treinador após o gol de Luis Suárez na derrota da Inglaterra para o Uruguai durante a Copa do Mundo, também. E apresentam um técnico que passou pela Itália sem deixar saudades.

O homem que descartou Roberto Carlos

Hodgson morava do outro lado dos Alpes quando foi contactado para  se transferir para Milão e fechar com a Inter, com a Serie A 1995-96 já em andamento. O inglês era o técnico da Suíça e aceitou trabalhar na equipe recém-adquirida por Massimo Moratti, a qual assumiu na 7ª rodada do campeonato. Teria o seu emprego de maior destaque pouco depois de comandar os helvéticos na Copa de 1994.

Quando Hodgson chegou na Inter, o clube havia investido bastante e acertado com nomes como Javier Zanetti, Sebastián Rambert, Maurizio Ganz, Salvatore Fresi, Roberto Carlos e seu compatriota, o inglês Paul Ince. Porém, Ottavio Bianchi, seu antecessor, conseguiu a proeza de cair na primeira fase da Copa Uefa para o pequeno Lugano, da Suíça, o que fez a diretoria buscar o inglês no próprio país alpino. English Roy tinha a missão de apagar incêndio, mas não conseguiu fazer mais do que uma temporada medíocre na Lombardia, concluída com a sétima posição no Campeonato Italiano.

O inglês não durou mais que uma outra temporada na Pinetina. Em 1996-97, a Inter se reforçou ainda mais com as contratações de Iván Zamorano, Youri Djorkaeff, Aron Winter e Ciriaco Sforza e até fez uma campanha melhor: foi terceira colocada na Serie A, mas perdeu a final da Copa Uefa para o Schalke 04, tecnicamente inferior.

Um perdido Hodgson se posiciona entre Suárez e Facchetti, dois homens com imensa história em Milão (Getty)

A derrota acabou ficando na conta de Hodgson, que foi alvo de moedas e isqueiros atirados pelos torcedores da Beneamata. Para se ter uma ideia, até mesmo o sempre calmo e educado Zanetti demonstrou irritação com o técnico na partida de volta da final – desculpando-se em seguida. Com o terceiro lugar já garantido, English Roy foi demitido após a final da copa e deu lugar a Luciano Castellini, que dirigiu a equipe nas duas últimas rodadas da Serie A.

Durante sua passagem pela Inter, o inglês ficou reconhecido por ser um homem decente, muito cortês, mas ao mesmo tempo sem afinidade com a persuasão e espírito vencedor – características atribuídas a Claudio Ranieri ao longo de quase toda sua carreira, por exemplo. Hodgson também ficou marcado por ter sido o técnico que dispensou Roberto Carlos, em uma das piores negociações da história recente do clube lombardo.

O inglês insistia em utilizar o brasileiro como meia aberto pela esquerda de seu 4-4-2 em linha, por considerá-lo indisciplinado taticamente e fraco do ponto de vista defensivo. Para manter seu espaço na seleção brasileira e jogar em sua posição de origem, Roberto pediu para ser negociado com o Real Madrid, clube em que fez história: venceu três Ligas dos Campeões (o mesmo número de Champions que a Inter conquistou desde sua fundação), e se tornou um dos maiores laterais esquerdos daquele período, com títulos mundiais acumulados pelo Real e pelo Brasil. Já Hodgson…

Galante, Hodgson conta uma piada de tiozão para The Guv’nor Paul Ince (Allsport/Getty)

Por incrível que pareça, o inglês teve outra oportunidade com os nerazzurri. Na horrenda temporada 1998-99 ele foi contratado como interino para as quatro últimas partidas da Serie A, acumulando vitórias contra Roma (5 a 4) e Bologna e derrotas contra Parma e Venezia. Após concluir a temporada na 8ª posição, a Beneamata teve de jogar duas partidas extras contra o Bologna (empatado em número de pontos) para decidir quem jogaria a Copa Uefa. Os bolonheses faturaram o spareggio com dois triunfos por 2 a 1 e ficaram com a vaga.

Mesmo com a má fama adquirida pela decepção na Inter, Hodgson ainda dirigiu a Udinese em 2001-02, temporada em que a equipe bianconera brigou para não ser rebaixada. O inglês entrou em atritos com a direção do clube friulano em sua passagem e acabou sendo demitido na 14ª rodada.

Jornais publicaram que ele teria dito que estava feliz por ter voltado a treinar um time da Serie A, mas que poderia ter escolhido uma agremiação melhor, porque “a Udinese é um clube muito estranho”. Hodgson nega ter dito estas palavras, mas assume que ficou aliviado por ter sido demitido, pois não se entendia com os cartolas. Vale ressaltar que o fracasso da equipe de Údine naquela temporada pode ser atribuído, sim, a ele, uma vez que o elenco era formado por vários jogadores de longa história no Friuli, como Morgan De Sanctis, Valerio Bertotto, Per Kroldrup, David Pizarro, Martin Jorgensen, David Di Michele, Vincenzo Iaquinta e Roberto Muzzi. Seria possível alcançar melhores resultados com este time, mas English Roy não demonstrou competência, mais uma vez.

Hodgson também teve uma curtíssima passagem pela Udinese (Allsport)

Quando era bom o senhor inglês
Apesar de ser reconhecido pelas suas falhas, Hodgson teve seus momentos de alta. O treinador se notabilizou por ser um homem do mundo: globetrotter, ele girou o planeta antes de chegar à Itália e continuou percorrendo distâncias após deixar o Belpaese. Poliglota, além de inglês, ele fala fluentemente sueco, norueguês, alemão, italiano e um pouco de dinamarquês, francês e finlandês.

Hodgson iniciou sua carreira como treinador no futebol sueco, em 1976, por indicação do amigo Bob Houghton, que treinava o Malmö. Roy levou o surpreendente Halmstads a dois títulos nacionais, o Örebro à primeira divisão, a Allsvenskan, e ainda faturou um pentacampeonato com o próprio Malmö, nos anos 1980. Os dois são tidos como dois dos responsáveis pela evolução do futebol da Suécia, pela introdução da marcação por zona e de maior rapidez nas transições – Sven-Göran Eriksson, por exemplo, tem muito em comum com o estilo dos ingleses.

Após se tornar mito na Suécia e recusar contrato vitalício do Malmö, Hodgson foi para a Suíça, país em que se destacou à frente do Neuchâtel Xamax – chegou a vencer o Real Madrid em uma partida da Copa Uefa. O inglês acabou substituindo Uli Stielike no comando da seleção nacional helvética e sobrou: classificou a Suíça para a Copa do Mundo, algo que não acontecia desde 1966.

Neste percurso, deixou para trás Portugal e Escócia, além de ter tirando pontos da Itália de Arrigo Sacchi na qualificatória – chamando, pela primeira vez, a atenção do futebol da Bota. No Mundial, classificou-se em segundo em um grupo que tinha Estados Unidos, Romênia e a favorita Colômbia, caindo apenas nas oitavas de final, diante da Espanha. Em 1995, ele fechou com a Inter, clube em que ficou até 1997.

Depois da primeira passagem pela Itália, Hodgson acertou com o Blackburn e teve alguns bons meses pelos Rovers antes de ser demitido – neste período, foi sondado para assumir as seleções da Alemanha e da Inglaterra. No entanto, parecia que o inglês tinha como destino ir bem somente nos países escandinavos: foi campeão com folga na Dinamarca, pelo Copenhagen e teve trabalhos satisfatórios pelo Viking (Noruega) e pela seleção da Finlândia.

Em 2007, Hodgson voltou a dirigir um clube inglês e renasceu para o futebol, após ser sétimo colocado na Premier League 2008-09 e vice campeão da Liga Europa em 2010. A aprovação do trabalho nos cottagers o levou ao Liverpool, no qual fracassou, e depois a uma medíocre passagem pelo West Bromwich. E, então, o prêmio: o English Team. Hora de voltar para a Escandinávia, Roy.

Roy Hodgson
Nascimento: 9 de gosto de 1947, em Croydon, Inglaterra
Carreira como técnico: Halmstads (1976-80), Bristol City (1982), IK Oddevold (1982), Örebro (1983-84), Malmö (1985-89), Neuchâtel Xamax (1989-92), Suíça (1992-95), Inter (1995-97 e 1999), Blackburn (1997-99), Grasshoppers (1999-2000), Copenhagen (2000-01), Udinese (2001), Emirados Árabes Unidos (2002-04), Viking (2004-05), Finlândia (2006-07), Fulham (2007-10), Liverpool (2010-11), West Bromwich (2011-12) e Inglaterra (2012-16)
Títulos conquistados: Allsvenskan (1976, 1979, 1985, 1986, 1987, 1988 e 1989), Copa da Suécia (1986 e 1989), Superliga Dinamarquesa (2001), Supercopa da Dinamarca (2001) e Segunda divisão norte da Suécia (1984)

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1 Comentário

  • Resumindo: Roy Hodgson só deu certo mesmo em times escandinavos e clubes ingleses de menor expressão, times grandes na mão desse cara é cagada na certa.

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